Palavras e números
O nome de Portugal está nas bocas do mundo. Os últimos dias ficam marcados, incontornavelmente, pela morte do primeiro prémio Nobel da Literatura do país, José Saramago, assinalada pelo Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura com discrição e abertura ao diálogo mesmo com quem se encontra mais longe das convicções que os católicos professam.
Registaram-se várias incursões em episódios passados, mais ou menos polémicos, em que o nome da Igreja esteve envolvido, embora em boa verdade a crítica de Saramago ao Cristianismo e ao texto bíblico (património de outros crentes, também) ficasse sempre limitada pelos “balizamentos ideológicos” que o referido Secretariado lamentava.
A morte do autor foi alvo de uma operação mediática gigantesca, que reduzia cada momento ao espectáculo, alimentado pelas naturais divergências que o escritor foi semeando ao longo da sua vida. A “novela” do local em que seriam depositadas as cinzas fica como exemplo de um jornalismo em que nem todos os profissionais do meio se podem rever.
Mais a Sul, o mundo olha também para Portugal, por outros motivos, igualmente mediáticos: o desempenho da selecção nacional de futebol no Mundial 2010. O jogo histórico contra a Coreia do Norte, sublinhado com sete golos, é celebrado como um feito inédito e uma prova de força, aparecendo uma multidão de novos “crentes” que, após anos de críticas à equipa, se converteram após terem presenciado esta espécie de milagre futebolístico.
O que fica para lá destes acontecimentos? Parece evidente a necessidade de encontrar um ponto de equilíbrio, que não diabolize ou divinize pessoas e números à velocidade da luz, que é a do actual mundo globalizado.
Um bom caminho está a ser sinalizado no trabalho desenvolvido e pensado pela Igreja Católica na sua relação com a cultura, em Portugal, que ganhou particular visibilidade após o notável encontro do Centro Cultural de Belém, aquando da visita de Bento XVI.
Aprender a ouvir, a falar e a calar, se for necessário, surge como um exercício particularmente difícil no mundo dos “sound bites”, em que se julga dono da razão quem gritar mais alto. Sem esse exercício, contudo, será sempre impossível ver para além da espuma dos dias…
Octávio Carmo
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