28/05/09

Mensagem e mensageiros

O Dia Mundial das Comunicações Sociais é uma ocasião para avaliar ou criticar, propor ou projectar a presença da Igreja Católica nos media. Este ano a acontecer entre um abundante caudal informativo sobre intervenções e presenças católicas, proposições acerca do carácter tecnológico das comunicações - que encontra na Mensagem do Papa um certeiro contributo - e a realização de projectos que testemunham o envolvimento eclesial nessas ferramentas mediáticas digitais.
O seu carácter determinante nos processos de comunicação motiva a necessidade frequente de não hiper-valorizar os meios, por mais poderosos e eficazes que sejam. Para acentuar a certeza da necessidade de uma mensagem, a ser comunicada através de um mensageiro. Ela é de todos os tempos, também de hoje.
Nova é a circunstância gerada pelo mundo digital: porque não estamos a falar de mais um meio, antes de um novo mensageiro.
A comunicação que acontece através dos meios tecnológicos não encontra nas ferramentas digitais apenas plataformas por onde passam conteúdos. Basta ver, por exemplo, o tratamento personalizado com que recebemos uma mensagem electrónica enviada para um sem número de remetentes. Ou a possibilidade crescente que cada receptor tem de escolher os conteúdos, informativos ou de entretenimento, que determinam a construção de personalidades de acordo com perspectivas culturais e valorativas dos outros e das coisas. E também as incidências comerciais dos recursos tecnológicos, que potenciam a capacidade desses meios em determinar os perfis dos consumidores para lhes oferecer, nos momentos oportunos, produtos, bens ou serviços.
Na valorização permanente da mensagem como imprescindível à comunicação, o crescimento das plataformas digitais desafia sobretudo os mensageiros. Porque uma ferramenta tecnológica, uma "rede social", pode emergir como mais eficaz para que a comunicação aconteça. Também na Igreja Católica. E por uma só razão: estará utilizar o mensageiro responsável por fazer chegar a maioria das mensagens a pessoas ou grupos sociais.
Projectos de Bento XVI no facebook, youtube ou wikicath, a ideia da Conferência Episcopal Portuguesa de falar da vocação através do myspace, ou a utilização do twitter para informar e do blog criar relação com os públicos por parte da Agência Ecclesia são opções a potenciar em ordem a uma eficaz comunicação. Porque se servem dos mensageiros capazes de fazer chegar mensagens aos públicos a que se destinam.

Paulo Rocha

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De olhos fechados!

Há momentos na nossa vida em que vemos mais longe de olhos fechados! A dor funda da perda, a raiva das amarras, o sabor da vitória, o pudor da conquista, o turbilhão da emoção, a quietude de uma paz por um segundo inabalável, a dúvida, alguma certeza, de novo a dúvida, mais alguma certeza...
Há momentos na nossa vida em que vemos mais longe de olhos fechados! O calor de um abraço, a alegria do encontro, o medo da solidão, o anonimato da multidão, a despedida, sobretudo aquela sem palavra definitiva e última...Há momentos na nossa vida em que vemos mais longe de olhos fechados! A memória de um gesto, que nos faz sorrir, a lembrança de outro gesto, que nos turva o semblante, a entrega insana pelos filhos, o filho que se perdeu, o irmão que voltou, a sombra do dia em que nos renegamos a nós mesmos, sem galo a anunciar a profecia, a aurora do outro dia em que nos voltamos a encontrar.Há momentos na nossa vida em que vemos mais longe de olhos fechados! Aqueles segundos de acção de graças, aquelas lágrimas que nos limparam a alma, aquele toque que nos aqueceu o coração. A verdade nua do que somos e do que aspiramos ser condensada numa prece, no esboço de um gesto.Há quem vislumbre nos dias que testemunhamos uma radical transformação civilizacional. Talvez seja pedir muito a quem anda há demasiado tempo a lamber as feridas de uma geração falhada. Pode ser também que haja aí motivo para alarido. Sinceramente não sei. Quem vier a seguir verá se assim foi, ou não. Pela minha parte, sinto e entendo que os tempos que protagonizamos pedem menos palavras, sobretudo as ditas, e economia de inteligência às que ainda forem proferidas. O hoje que vivemos pede sobretudo mais compaixão e demorado silêncio. Há dor – num tempo de tantas dores – que se partilha com mais afinco na palma das mãos e de lábios cerrados. Sem que haja aí novidade. A cada página do Evangelho vemos apontado o caminho: acolher cada um na sua vida concreta, nas suas misérias e errâncias, também na sua bondade e capacidade de sonho; confrontá-lo com uma opção de amor; e, bem mais difícil ainda, respeitá-lo na sua liberdade de escolha. Não se trata de militância, como alguns pretendem, mas de convicção interior, suficientemente luminosa para dispensar as palavras e encarnada o bastante para irradiar vínculos de comunhão. Afinal, os trilhos da eternidade desenham-se no barro que somos e de que fazemos a única cruz de todos os dias, mesmo depois do derradeiro ocaso. Há tanto para ver de olhos fechados.

João Soalheiro

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O melhor lugar para se avistar o Cristo-Rei

Diz-se, no Brasil, que «ser carioca é… procurar em cada janela se há uma vista para o Cristo que está no monte». Facto que uma conhecida canção de Tom Jobim dedilha assim: «Muita calma pra pensar/ e ter tempo pra sonhar,/ da janela vejo o Corcovado, o Redentor, / que lindo!». Talvez ainda não se tenha conseguido, em Lisboa ou Setúbal, a mesma centralidade afectiva e simbólica que a imagem de Cristo-Rei conhece do outro lado do oceano.
Ela ali funciona como ícone de força indesmentível! Mas há 50 anos que, entre nós, o Cristo-Rei se avista (e nos avista). E as comemorações que, esta semana, a Igreja portuguesa promove, dão que pensar. O Cristo-Rei, plantado junto do Tejo, surge-nos desde muito longe na paisagem, e podemos fazer quilómetros e quilómetros com ele no horizonte. Calculamos por ele a distância que nos separa do nosso destino, e esse facto tem ressonâncias que não são apenas geográficas e exteriores. Olhamos e o tempo parece mais interior e lento. A imagem de Cristo está ali. Os seus braços abertos ensinam-nos pacientemente uma largueza que ainda não temos e uma arte do acolhimento que as nossas gramáticas soletram com dificuldade. Mas o seu gesto constitui, só por si, uma alavanca da nossa realidade. Reabilita as histórias que escrevemos, empresta-lhes uma intensidade súbita, um toque divino. Podemos estar sempre a vê-lo duma janela de casa, do corredor envidraçado do prédio onde trabalhamos, do alto da rua que entra nas nossas rotinas. Ou ao contrário: podemos só avistá-lo ao longe, ou de quando em quando, se nos calha andar por certos lados. Mas se perguntarmos: «qual é o melhor lugar para avistar o Cristo-Rei?», apercebemo-nos depressa que o lugar ideal, o que oferece um retrato mais fiel é sempre o coração humano. É verdade que há miradouros notáveis e horas e estações mais privilegiadas do que outras. Mas o essencial é invisível aos olhos. E o Cristo-Rei pede-nos para ser visto com o coração!

Tolentino Mendonça

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Moção de Censura ao Papa

A mensagem deste ano para o Dia Mundial das Comunicações Sociais é uma das mais fascinantes destes 43 de celebração. Acerta em cheio nas esperanças e dúvidas que nos geram as novas tecno-logias, sobretudo para as crianças e jovens.
Se por um lado a média de vida aumentou - cada vez há mais gente a trabalhar aos setenta ou mais – por outro, envelhece-se mais cedo porque as novas tecnologias vão gerando iliteracia digital com uma velocidade estonteante, deixando os dedos ágeis das crianças a tocar as suas sinfonias criptadas que irritam os adultos e os deixam despeitados de não caminharem à velocidade instintiva das novas gerações. O cartaz do Dia Mundial deste parece um enigma. E de facto é. Espécie de provocação para que quem não sabe pergunte do que se trata e o que significa. Que olha o planeta rodeado por asteróides tanto da Net como dos telemóveis.Veja-se por exemplo: Google, Wikipédia, Twitter, Myspace, YouToube, Chats, Blogs, Hi5, Facebook, Ipod, Mp3, 4, Messenger, e mais um interminável desfile de siglas que, aliadas aos compactos literários de quem – diz-se - comete erros ortográficos, desencadeia vias comunica-cionais nunca existentes no passado. Por isso se recomenda na carta que acompanha o cartaz: “olhe bem. Parece que há uma gralha no título. Procure entender o que lá está. Se não sabe, pergunte aos jovens e adolescentes. É o que anda nas pontas dos dedos de quase todos. Como diz o Papa: muitas vezes esse mundo parece-nos estranho.” O lançamento do Dia Mundial das Comunicações Sociais deste ano, a nível nacional, será marcado por um “confronto” de jornalistas: como trataram a Igreja desde as conferências do Casino da Figueira às declarações do Papa no avião para os Camarões? Ou, como esteve a Igreja nesses acontecimentos? Não esquecendo a forma como foi noticiada a canonização do Santo Condes-tável, ou o último acontecimento conhecido: a “moção de censura” dos membros do órgão máximo da Câmara Baixa de Espanha (PSOE, CiU, PNV e parte do PP) a pedir ao Papa explicações pelas suas declarações sobre a SIDA em recente viagem à África. Como se as palavras do Papa tivessem um valor coercitivo. Dizia o E-Cristians: ”O Congresso dos Deputados não é ninguém para intrometer-se no âmbito das considerações morais que de uma posição religiosa se possam manifestar porque, ao actuar assim atenta contra o princípio constitucional de neutralidade do Estado”. E se os belgas(que fizeram algo de semelhante) ouvirem esta teoria, até lhes fará bem. Mas isso iremos debater no próximo dia 21 na Universidade Católica, no encontro de jornalistas.

António Rego

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Inclusão do semelhante

Ser diferente ou existir em minoria é o estandarte para reivindicar a bandeira da inclusão. E com justiça, pois nunca são de monta as diferenças evocadas para distinguir pessoas, grupos ou etnias. A unir todas as particularidades está essa circunstância única que é a dignidade da pessoa: uma condição antes de ser um direito. O problema não se colocará, no entanto, apenas em contextos de diferença.
Também onde reina a semelhança não são poucos os episódios de exclusão, de diferenciação, de distinção subjectiva de pessoas, ideias ou projectos. E com o prejuízo que decorre dessas atitudes: para o próprio grupo, como também para toda a sociedade. São mais notórias essas “falsas-diferenças” quando emergem na história do presente exemplos de grandes feitos à custa da construção da unidade entre pessoas, ao redor de causas, sejam elas nacionais ou religiosas, mas sempre humanas. É o caso de S. Nuno de Santa Maria, o Condestável que rejeitava apenas o erro, o perverso, o corrupto para catalisar esforços em benefício de objectivos maiores. E com resultados históricos, uma Nação, e pessoais, a santidade, que estão agora diante de tudo e de todos. São também mais necessários os pequenos e os grandes contributos, todos os recursos, quando se quer “reinventar a solidariedade” que proporcione dignidade de vida a todas as pessoas, devolva a justiça e a paz às sociedades e permita a existência a todos os seres. São ainda esperadas atitudes solícitas de homens e mulheres que optam por de serem sinais e agentes de um novo Reino, proclamado há 2000 anos, apostado em fazer da ordem natural das coisas a lei por excelência para a relação entre pessoas e para o governo das coisas. Cada um na sua circunstância e seguindo sempre as pisadas de um Mestre que em todos os momentos fez a vontade d’Aquele que O enviou. Na era da fragmentação das pessoas, das coisas, do tempo e do espaço, urge devolver a continuidade e a estabilidade a projectos que visam a construção da dignidade humana. Na espera paciente por resultados positivos e duradouros e na inclusão de todas as partes: as que são diferentes e também as que são semelhantes.

Paulo Rocha

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Um ícone da radicalidade

No próximo Domingo o Papa Bento XVI presidirá à canonização do donato carmelita Nuno de Santa Maria, o Beato Nuno, D. Nuno Álvares Pereira, o Condestável, ou, como o povo há muito se habituou a tratar, com a sua consabida sabedoria, o Santo Condestável. Raramente, no percurso da comunidade lusa, uma figura alcançou resistir com tanto vigor a modas, tempos e vontades, para sobreviver com renovada presença num hoje que nos é dado testemunhar.
Nem todos vêem o mesmo quando pousam os olhos na envergadura deste Nuno. Alguns recusam-se mesmo a ver o óbvio. A busca do absoluto, nos séculos XIV e XV como no século XXI, tinge-se com as marcas da radicalidade, provada numa vida que, sem deixar de ser intensamente vivida, não raro confunde os protagonistas do convívio, em primeira ou em segunda mão. Os clamores materializados pelos contemporâneos de D. Nuno Álvares Pereira em face da sua opção religiosa foram seguramente bem mais audíveis que o não-senso de alguns dos nossos contemporâneos, incansáveis em combater tudo o que não entendem e todos os que não conseguem tolerar. Seja como for, a vocação religiosa de Nuno de Santa Maria moldurou em definitivo a exemplaridade de uma vida. E não foi, por certo, o singular desempenho das responsabilidades públicas que trouxe a D. Nuno Álvares Pereira o afecto terno de tantas portuguesas e de tantos portugueses, vertido na confiança da sua intercessão junto d’Aquele a quem sempre procurou e a quem soube entregar-se inteiramente. Nos dias que correm, propor como ícone de santidade um homem com o percurso de vida como o protagonizado pelo Santo Condestável é um gesto que não deixa de dar visibilidade a uma provocação: tu, leitor, já te procuraste nos trilhos do mundo e nos caminhos do coração? Que viste nas tuas deambulações em busca de ti mesmo? Acreditas que não estás sozinho neste permanente construir da tua pessoa? Arrisca questionar o teu percurso à luz do que Deus te pede, talvez descubras que a vocação, também a religiosa, é sempre um projecto de amor.

João Soalheiro

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Em busca de respostas

Todas as tragédias têm sobre o ser humano o efeito de o fazer partir em busca de respostas. O mundo uniu-se ao sofrimento e à busca de sentido dos habitantes da região italiana de Abruzzo, que de um momento para o outro viram ruir, à sua volta, uma vida que tanto custara a construir: entes queridos, casas, negócios, tudo desabou num instante, sem que nunca se chegue a perceber o motivo para tal. Ao longo dos dias que se seguiram à catástrofe provocada pelo terramoto, o Papa "adoptou" esta situação e foi deixando vários gestos de solidariedade para com as vítimas, confortadas no seu sofrimento pela certeza de que o mesmo não era indiferente, não passava despercebido no mundo, não era apenas mais um episódio no espectáculo mediático em que muitas vezes se transforma a vida de milhões e milhões de seres humanos. A Páscoa, com todo o seu esplendor, abre uma porta para quem busca respostas. A fé, disse o Papa, é fonte de esperança e de luz, mesmo nos tempos mais tenebrosos e, sobretudo, mesmo debaixo dos olhares cépticos ou escarnecedores de quem não entende nem quer entender como é que aquilo que não se vê pode dar um sentido a esta vida. Cada Páscoa é um recomeço e, apesar de toda a dor e do desespero que possa ter tomado conta da vida de quem foi afectada pelo sismo, a vida em L'Aquila também deverá recomeçar. Com o apoio material e espiritual de que tiverem necessidade e que deve continuar presente, mesmo quando o sismo já não for notícia e outras histórias do quotidiano tomarem o seu lugar na primeira página. Situações como estas, aliás, são noticiáveis apenas até certo ponto: o drama individual, a perda de um filho ou o milagre da sobrevivência não se quantificam, mesmo que queiramos, não se explicam. De certa forma, perante toda a informação que nos chega, só a noção de que estamos unidos nesta busca de respostas, na fragilidade do quotidiano, permite estar efectivamente junto destas pessoas. A "sombra" do terramoto, por outro lado, serviu este ano para encher jornais e enquadrar as celebrações de Semana Santa, sem necessidade de recorrer a polémicas sobre Dan Brown, Mel Gibson ou um suposto Evangelho de Judas, como aconteceu em anos anteriores. Sem terem culpa disso, as vítimas italianas foram o cordeiro sacrificado no circo mediático que não consegue encontrar nesta quadra respostas para além do óbvio e da futilidade.

Octávio Carmo

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